quarta-feira, 1 de julho de 2009

O adeus de Pina Bausch

Foto: Gonçalo Santos
As artes cênicas perdem a revolucionária inventora da dança-teatro, que morreu ontem de câncer, aos 68 anos, na Alemanha

Morreu ontem pela manhã aos 68 anos a coreógrafa alemã Pina Bausch, a artista que dissolveu os limites entre teatro e dança, sem dúvida uma das mais importantes e influentes personalidades da artes cênicas no século 20. Pina, que faria 69 anos no dia 27, morreu no hospital "de forma rápida e inesperada apenas cinco dias após ter recebido o diagnóstico de câncer", informou Ursula Popp, a porta-voz do Tanztheater Wuppertal.

A companhia, fundada por Pina Bausch em 1973, cujo raio de influência atingiu dançarinos do mundo inteiro, estava em apresentação na Polônia e viria ao Brasil em setembro com dois programas: Café Müller, obra para seis bailarinos, considerada marco na carreira da coreógrafa e da qual ela ainda participava, eventualmente, como bailarina; e A Sagração da Primavera, criada para 42 bailarinos. Os dois espetáculos integram a programação de segundo semestre da Temporada de Dança do Teatro Alfa, e as apresentações devem ser mantidas, apesar da perda da criadora e mestra Pina Bausch.

Pina nasceu em Solingen, na Alemanha, em 27 de julho de 1940. Estudou na mais importante escola moderna de seu país, a Folkwang, em Essen, dirigida por Kurt Jooss, onde recebeu e transformou a herança dos mestres do expressionismo como Laban. Estudou também na conceituada escola de dança norte-americana Juilliard. Logo alçou voo autoral. Um de seus méritos, apontam especialistas, foi recuperar o pensamento do coreógrafo Jean-Jacques Noverre (1727 -1810) cujo trabalho recebeu o nome de balé de ação.

A retomada da arte de Noverre, por ela aprimorada ao longo dos anos, levou à implosão da fronteira entre dança e teatro. Fenômeno estético que os brasileiros puderam conferir com seus próprios olhos no palco do mesmo Teatro Alfa, em 2007, quando Pina Bausch e seus bailarinos (entre eles, duas brasileiras, Regina Advento e Ruth Amarante), apresentaram o balé Água, que tinha o Brasil como fonte de inspiração.

Num dos números, uma bailarina entrava solitária no palco com um travesseiro na mão e se acomodava para dormir. A atmosfera era bucólica, um bangalô em meio à natureza no qual se ouviam grilos e aves noturnas. Ocorre que os sons pouco a pouco aumentavam de volume e se diversificavam num coral altissonante, não deixando a moça dormir. Entre risos, o espectador se dava conta que compreenderia seu desejo de cortar todas as árvores. Humor, sinal de inteligência, estava entre as qualidades dessa artista que revolucionou a dança.

Pina Bausch veio ao Brasil pela terceira vez em 1997 para apresentar pela primeira vez no País uma ópera, Ifigênia em Tauris, de Gluck, e a coreografia Cravos, ambas no Teatro Municipal do Rio. O impacto visual da segunda - o palco era inundado por 8 mil cravos vermelhos - foi tão intenso que, ao contrário das visitas anteriores, desta vez sua obra agradou ao grande público. Essa coreografia inaugurou uma parceria jamais desfeita, entre Pina Bausch, Marion Cito nos figurinos e Peter Pabst nos cenários. E mais. Nessa ocasião a coreógrafa conheceu o brasileiro Caetano Veloso, a quem convidou para participar da festa de comemoração, na Alemanha, dos 25 anos da Tanztheater Wuppertal, em 1998.

Na programação de aniversário, estavam sete peças: Ifigênia em Tauris (1974), Café Müller (1974), Arien (1979), Viktor (1986), Palermo, Palermo (1989), Nur Du (1996), coreografia que consagrou mundialmente a dançarina brasileira Regina Advento, e Der Fenstputzer (1997). Caetano participou com dois concertos. Em comum com o cantor e compositor brasileiro, Pina Bausch tem a participação num filme de Pedro Almodóvar, Fale com Ela.

Café Müller é uma das primeiras e mais importantes peças de Pina. Ela tem apenas 30 minutos, seus espetáculos sempre duram no mínimo duas horas, e é representada apenas por seis bailarinos, outra característica rara. Infelizmente, não terá mais a participação da coreógrafa. Ainda assim, os brasileiros poderão assistir à essa peça em setembro, apenas um mês antes do aniversário de 36 anos da Tanztheater Wuppertal. Pina foi casada com o cenógrafo holandês Rolf Borzik, morto em 1980, e atualmente com o chileno Ronald Kay.
Colaboração: professora Fabiana Fonseca

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